domingo, 3 de janeiro de 2021

"Crónicas de Allaryia: As Vagas de Fogo", by Filipe Faria. | A coisa está a melhorar... | E um "life update" não sei bem porquê...

 Esperava ler este livro em pouco tempo, como disse na review do anterior, comecei a ler "As Vagas de Fogo" no mesmo dia em que acabei "A Essência da Lâmina". Contudo a minha vida deu uma daquelas reviravoltas inesperadas. Ainda sem ter acabado a tese (que ainda está no limbo), decidi inscrever-me no site oficial para a contratação de professores e tentar a minha sorte. Pensei que não tinha nada a perder, nunca nenhuma escola aceitaria alguém apenas com licenciatura (nem dava para pôr a Pós-graduação no site) e sem experiência alguma, como professor de História. Portanto concorri já convencido de que não iria conseguir. Tenho uma amiga que já tem Mestrado e que está à mais de um ano a procurar emprego... nunca conseguindo. Ainda por cima no meio da pandemia, cada vez há mais desemprego em Portugal, vejo isso nas notícias quase todas as semanas.

Mas "o azar de uns, é a sorte de outros", como a minha avó costuma dizer. Dois dias depois de me ter inscrito em concursos para várias escolas (mais ou menos na minha zona), estava eu com umas mantinha nos joelhos e sentado à minha secretária, a ler precisamente "As Vagas de Fogo", quando toca o telefone. Cerca de dois minutos depois já sou professor contratado de História (e Teatro... mas ainda não sabia disso). Primeiro emprego, sem estágio profissional, sem experiência, completamente às cegas... e para começar já na terça-feira (isto passa-se a uma sexta-feira). Só na segunda-feira é que descobri o meu horário, quantas turmas, de quais anos de escolaridade e o facto de também ter de dar a disciplina de oferta de escola: Teatro. Eu... a dar Teatro... eu, introvertido, que já estava nervoso por ter de dar aulas a 193 alunos, que não gosto de me expor devido ao meu aspecto e personalidade... agora tenho de ensinar os alunos a fazer algo que eu próprio não percebo nada... Felizmente houve uma salvação, algo que grande parte das pessoas abomina, apenas tolerando devido à pandemia, todos os dias oiço queixas e lamúrias sobre como a vida ficou complicada devido a esta pequena adição aos costumes diários... para mim, é a minha protecção contra os olhos dos outros, uma barreira física e mental que me abstém de qualquer julgamento feito sobre o meu aspecto. Enquanto uso a máscara, consigo enfrentar cem pessoas por dia em contacto directo. Ninguém conhece a minha cara, ninguém me pode julgar... gostava que pudesse manter a máscara para sempre, mas felizmente por um lado e infelizmente pelo outro, acho que este pode ser o último ano em que "usar máscara" vai fazer parte da "normalidade".

Talvez, daqui a uns meses, quando voltar a estar desempregado, deva fazer uma entrada aqui apenas sobre a minha experiência com o uso da máscara. Isto para dizer que comecei a trabalhar, o meu horário é possivelmente o pior de todos (segundo os outros professores dizem). Apenas trabalho 20 horas por semana, contudo não tenho uma única aula seguida, tenho um horário cheio de furos que me faz sair de casa às 7 e chegar às 19 quatro dias por semana. Não soa muito mau... não fosse a quantidade colossal de trabalho que tenho de fazer em casa nos meus três dias de fim-de-semana. Tenho turmas que requerem que eu prepare as aulas em várias línguas... só isso são pelo menos dois dias de preparação, por semana. Mas enfim, um dia também tenho de escrever sobre isto, resumidamente fiquei sem "tempo livre", e quando o tenho - não o tenho na realidade, pois à noite já não tenho cabeça para ler, depois de levantar às 6 da manha e chegar a casa às 19, e ainda ter de fazer sumários e outros "deveres". O meu tempo de leitura desapareceu a meio de Outubro, tendo apenas sido retomado agora na última semana do ano.

Já reclamei demais da minha vida. Vamos lá ao livro.

 

**Aviso: O texto que se segue pode conter spoilers e uma considerável quantidade de sarcasmo.**

**Aviso 2.0: Tudo o que se segue provém da minha opinião pessoal. Ou seja, não têm qualquer valor para ninguém que não eu.** 

 


Novamente as personagens principais encontram-se separadas o que, a meu ver e tal como no livro anterior, melhora consideravelmente o desenrolar do enredo. Ao passar mais tempo com cada personagem consegui-mos compreender melhor as suas motivações. Todavia, a meu ver, temos "PoV's" de demasiadas personagens. Não digo isto a nível numérico, podiam até ser cem personagens "PoV". Como na "A Essência da Lâmina" o termo "PoV" não será o mais correcto para as "Crónicas de Allaryia", o narrador (mais sobre ele adiante) é omnipresente, sabe tudo sobre todos, omitindo apenas o que lhe convém para tentar criar algum mistério no enredo. Por vezes saltando entre os pensamentos de várias personagens, num mesmo capítulo sem quebra de parágrafo. E eis a primeira problemática.

Não digo que temos acesso a tudo, por exemplo não faço ideia qual seja o plano final de Seltor (com certeza algo que faça sentido, visto que é a personagem mais intrigante do livro), contudo grande parte dos acontecimentos é "estragado" devido ao leitor ter acesso aos pensamentos de várias personagens (felizmente não todas). Por exemplo, a revelação da identidade e planos de Dilet foi inesperada e com sentido (também havemos de lá chegar). Como não tive acesso aos pensamentos da personagem toda aquela revelação foi intrigante. O mesmo não se pode dizer, por exemplo, de Tannath. Leio um capítulo centrado nele, onde a personagem revela o que planeia fazer... depois obviamente não há nenhum impacto quando leio um capítulo centrado em outra personagem e Tannath aparece para fazer precisamente aquilo que foi exposto à uns capítulos atrás. Não há qualquer empatia com o espanto, medo ou pânico das outras personagens, pois o próprio livro já me tinha dado "spoilers" sobre o que iria acontecer. Devido a este detalhe na escrita do autor (a nível do português continua perfeito, na minha opinião), acho que a história perde algum potencial. Há certos capítulos que me conseguem prender e, aquando do final, me fazem passar imediatamente para o seguinte. Mas outros, fazem-me perder a vontade de continuar, lá está, especialmente quando relevam o que vai acontecer em algum capítulo subsequente.

Voltando agora ao narrador. Desde o primeiro livro que a história nos é narrada por uma personagem, Per...Pre... (não me lembro como se escreve o nome... mil desculpas), enfim algo acontece logo no começo num "capítulo" (anexo) intrigante onde, aparentemente, o próprio narrador é morto! Quem é que está a narrar a história agora? Contudo não notei grande diferença de estilo, apenas desapareceram os textos iniciais e finais assinados pela personagem. Mas achei positivo, algo inesperado. Ninguém espera que o narrador morra a meio da saga tal como o animador dos Monty Python and the Holy Grail.

Partindo agora para um olhar sobre as personagens, este livro centrou-se muito em Quenestil que, juntamente com Slayra, se comportou como uma criança (ou talvez como um adolescente mal humorado) durante o decorrer de todo o enredo. Ambas as personagens mereciam simplesmente um par de estalos e um balde de água fria, o mundo está a acabar, os amigos deles lutam pela sua sobrevivência, e estes dois esqueletos sem cérebro andam a fazer birrinhas! O que vale é que tudo em seu redor era muito mais interessante que as duas personagens. Para mim teria sido mais intrigante (acho que estou a usar muito esta palavra hoje) se tivessem sido exploradas as características do local onde se encontravam, do povo e dos conflitos com os grupos vizinhos... quer dizer, isto foi abordado e explorado... mas podia ter sido muito mais aprofundado em vez de perder tempo com as duas crianças (Quenestil e Slayra, não literalmente os dois bebés). O Quenestil está completamente perdido, a Slayra estava grávida e ele não deu o mínimo de apoio. Depois do parto, mesma coisa, nem foi ver as crianças... epá estava na dúvida se eram dele ou não, porque não olha para eles? Ele e a Slayra não são o mesmo tipo de elfo eahan! Se as crianças são dele, com certeza devem ter alguma característica dele! Abra os olhos e vá ver! Mas não... anda feito barata tonta e depois acaba a meter-se onde não devia. A Slayra, compreendo que sofreu imenso devido ao Quenestil, mas também não pensa nas consequências da sua vingança... ou melhor, pensa em si, assegurando um lugar como uma das mulheres lá do outro chefe... mas então e as crianças? O tal chefe pode nem as aceitar e manda-las matar... sei lá, isto ainda está em suspenso para o próximo volume. Chega destes dois.

A personagem principal, Aewyre cresceu imenso neste volume. Na minha opinião tornou-se na personagem mais interessante do grupo original. Juntamente com Kror e outras duas personagens (também interessantes), tenta finalmente regressar a Ul-Thoryn, com imensas peripécias e contratempos pelo meio. Aproveito aqui para mencionar que este livro teve poucas cenas de luta, comparativamente aos anteriores, o que é muito positivo (a meu ver). Kror também se tornou muito mais denso como personagem, até acabo a torcer por ele. O pobre coitado não quer saber da Essência da Lâmina, não precisa dela, apenas quer regressar a Karatai, onde se pode dizer que foi feliz. Relativamente a Kror, Aewyre até demonstra um lado mais negro, com as suas acções para com este.

Todo o enredo em volta de Ul-Thoryn representa uma das minhas partes favoritas, contudo vou-me focar num pequeno detalhe que achei "negativo"... não propriamente negativo, até positivo... que impressionou mas dececionou um pouquinho ao mesmo tempo. (Frase confusa não?). Dilet, esperou tantos anos para executar a sua vingança... e depois deitou tudo a perder. Se ele tivesse ficado calado, os cortesãos, guardas e etc teriam começado todos à pancada na mesma devido ao teixo, com as restantes personagens principais no meio, ele apenas teria de se colocar num local seguro a ver a desgraça... e depois matar os seus alvos (caso estes ainda estivessem vivos). Mas não... depois de décadas a planear a preparar, deitou tudo a perder para fazer um típico discurso de vilão. Este capítulo foi bom e mau ao mesmo tempo, muita cena de luta, mas morreram muitas personagens relativamente relevantes. Todavia acho que foi o ponto alto do livro, o culminar de enredos que já vinham desde o primeiro volume.

Terminando agora com Seltor. A personagem é das mais intrigantes da história, ainda não percebi bem qual é o seu objectivo (ainda bem), suspeito que talvez ele não seja o típico "dark lord"... talvez até pelo contrário, estará ele a tentar salvar o mundo, e as personagens (sem se aperceberem) a tentar impedi-lo de alcançar esse objectivo? Todos aqueles deuses pareceram-me muito estranhos... este é um dos mistérios que me dá vontade de ir já começar o próximo livro. Contudo não se livra de uma criticazinha! Novamente, o problema da revelação do que acontece com certas personagens. Para mim, Seltor devia ser a personagem mais misteriosa de todas, apenas aparecendo quando interage com alguma outra personagem e não como foco de um capítulo. Acho que teria sido muito mais impactante se, ao longo do enredo, fossem sido deixadas pistas de que algo se passava com os deuses... estes não estavam a responder aos seus fieis e assim. Isto acontece, mas não é mistério nenhum, pois temos capítulos centrados em Seltor, onde este anda a matar os deuses... mais uma vez inviabilizando o potencial mistério.

E já se faz tarde, vou ficar por aqui. Desta vez vou dar o benefício da dúvida ao livro, acho que tudo tem vindo a melhorar desde o primeiro volume. Vou dar um 4/5 a este... mas é um 4 pequenino. Isto ainda pode crescer.

Agora, começo já o próximo ou leio outra coisa entretanto? Ainda não sei. Eu tenho a sensação de que prefiro ler estes livros de enfiada, pelo menos uns 2-4 capítulos (dependendo do tamanho destes) mínimo por dia. Devido à minha situação actual, apenas devo conseguir ler uns poucos capítulos ao fim de semana... podendo levar meses a acabar o livro. E depois, mesmo fazendo apontamentos (como fiz para este), vou-me esquecer de pormenores... entre o alvoroço das aulas e avaliações dos alunos não sei se me consigo concentrar na história. Talvez apenas volte a pegar nisto no Verão, mas também não queria ficar sem ler nada durante meses... enfim depois penso como fazer, nem sei porque estou aqui a escrever isto, já se faz tarde.

Ainda vou ouvir uma das conversas do autor (Filipe Faria), com a autora Madalena Santos. Filipe Faria teve uma excelente ideia em começar um canal de YouTube, onde tem conversas com outros autores portugueses. Acho fascinante e uma enorme fonte de inspiração para alguém como eu, com esperanças de um dia conseguir publicar alguma coisa... mas primeiro tenho de ler, ler e ler... e depois escrever e escrever e mais escrever... tudo a seu tempo.

Uma vénia à arte da capa original do livro... uma pena eu não ter essa versão.



 Ah! Já agora, por nenhuma razão em especial, durante estas férias de natal arrumei a minha estante de livros! Não tenho muitos e, infelizmente, não os consigo organizar bem, pois a estante (feita á mão pela minha mãe à uns anos - ela tem jeito para estas coisas) não tem todas a prateleiras uniformes, portanto alguns livros que deviam estar juntos não cabem por uma questão de milímetros. Mas enfim, para a estante de livros "só meus" (na divisão ao lado não faltam livros, mas estes são os adquiridos por mim, para mim) já não está mau para um principiante.


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